Nas férias passadas, mais uma vez não viajei. Fiquei ao sabor do tempo. E como as férias foram feitas para ficarmos à toa, num dos dias entreguei-me a fuçar caixas, gavetas e armários. É uma delícia! Eu gosto! Nesses esconderijos do passado guardamos objetos pessoais, fotografias, escritos, papéis e mais papéis. É incrível como eu tenho papéis!
Por conta disso, comecei a me perguntar: por que guardamos as coisas? Talvez existam várias respostas para essa pergunta, mas tenho comigo, que a resposta mais coerente seria porque o ser humano, a caminho do futuro, deixa marcas daquilo que faz e realiza, logo, indiretamente, controla o tempo, esse senhor sutil que nos rege. E isso não é de hoje. Os egípcios deixaram as pirâmides; os gregos, as esculturas; os romanos, seus afrescos; os renascentistas, suas pinturas e nós, na nossa contemporaneidade, deixaremos os escritos e imagens, pois nunca se compartilhou tantos textos e imagens na Internet.
Por pensar assim, acredito que é por meio dos objetos, dos escritos, das fotografias, e sabe Deus mais o quê, é que as lembranças e sentimentos se impõem fisicamente a nós. Neles estão registrados o que fomos; o que conquistamos; o que fizemos e o que representamos às pessoas. Neles agregamos sentimentos e neles estão contidos as lembranças adormecidas por meio de imagens. E é Impressionante como as imagens e sentimentos emergem ao tocá-los, nos transportando involuntariamente para anos atrás, como se o passado se transformasse em presente num simples toque.
Esse fenômeno da memória involuntária está bem caracterizado numa série de livros chamada Em busca do tempo perdido de Proust, escritor francês do início do século XX, que tratava esse tema da busca incessante do tempo. No livro: No caminho de Swann esse fenômeno é representado na cena clássica do momento em que a personagem ao provar de uma simples Madeleine, um tipo de bolinho, molhada no chá lhe vem à mente todo um passado.
Nessa empreitada de rever o passado, parei mais demoradamente em quatro textos escritos por mim há certo tempo, mas que para mim tem uma história pessoal, pois são significativos: o poema que escrevi em homenagem a John Lennon e aos Beatles que considero minha primeira criação espontânea sem a imposição da escola; o discurso que fiz para comemorar o último dia de aula do Ensino Médio [antigo colegial], onde percebo relances de ideais futuros de um bom professor; o poema que fiz para Cora Coralina, poeta que admirava e admiro até hoje por sua mensagem de vida e o texto poético que escrevi sobre os olhos e que é para mim um orgulho, pois foi escolhido e publicado pela minha professora de Língua portuguesa na Faculdade para compor a primeira Revista de Letras da Fundação Santo André.
Enfim, foi nesse ato voluntário de fuçar caixas, gavetas e armários que me reencontrei com esses tempos que, para mim, ficaram marcados de emoções boas e verdadeiras.
Santo André - Terça-feira - outono - original: 15.02.2011 às 10h50min - atualizado em: 05.04.2011 às 09h51min
2 comentários:
Adorei o texto! Agora, que comentou destes seus escritos, que tal publicá-los no blog? Fiquei curiosa!
Estou pensando, vamos ver se crio coragem.
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